Num mundo cada vez mais interligado, as infra-estruturas digitais tornaram-se tão essenciais como as estradas, os portos e os aeroportos. O anúncio do novo cabo submarino da Google, Sol, que liga os Estados Unidos, as Bermudas, os Açores e a Espanha, constitui um marco importante não só em termos de conetividade, mas também da crescente importância estratégica de Portugal no mapa digital mundial.

Poucas pessoas se apercebem de que Portugal já tem ancorados mais de 25% dos cabos submarinos de fibra ótica do mundo. Agora, com o cabo Sol, essa liderança está prestes a ser reforçada. Não se trata apenas de uma Internet mais rápida. Trata-se de fluxos de dados globais, de infra-estruturas de computação em nuvem, de serviços de inteligência artificial e de competitividade económica a longo prazo. Em termos simples, quem controla os cabos controla o fluxo do mundo digital.

O novo sistema Sol complementa o cabo Nuvem, anteriormente anunciado pela Google, e os dois cabos serão interligados em vários locais, incluindo os Açores, um arquipélago português que está a emergir como um nó atlântico crucial para as infra-estruturas digitais. Estes dois cabos não só aumentarão a capacidade e a redundância da rede transatlântica, como também melhorarão drasticamente a resiliência contra interrupções, falhas técnicas ou riscos geopolíticos.

As implicações são de grande alcance. Por um lado, os Açores tornar-se-ão o ponto de aterragem central de uma autoestrada digital que liga a Florida diretamente à Europa. Pela primeira vez, um cabo de fibra ótica criará uma ligação direta entre Palm Coast, na Flórida, e o continente europeu através das ilhas do meio do Atlântico em Portugal, solidificando os Açores como um centro digital transatlântico.

Esta mudança representa mais do que geografia. Trata-se de uma mudança estratégica para a Europa, que permite ao continente diversificar as suas rotas digitais, aumentar a sua soberania em matéria de dados e diminuir a sua dependência das rotas do norte através do Reino Unido ou da Escandinávia. Também aumenta a competitividade da Europa face à crescente procura de computação em nuvem e processamento de IA, particularmente à medida que a infraestrutura tecnológica se torna mais central para a segurança, a inovação e o crescimento económico.

Para Portugal, esta é uma oportunidade histórica. A posição geográfica do país, outrora fundamental para a exploração dos oceanos, está a tornar-se igualmente valiosa na era digital. Ao investir em cabos submarinos, Portugal reforça o seu papel de porta de entrada entre continentes, transformando a geografia em capital digital. É também um sinal de que áreas regionais como os Açores podem desempenhar um papel vital no desenvolvimento de infra-estruturas globais, não como espectadores passivos, mas como facilitadores activos do progresso.

Além disso, espera-se que o projeto Sol atraia investimentos, crie empregos e impulsione a inovação em todos os sectores. Os fornecedores de serviços de computação em nuvem, as startups de IA e as indústrias com utilização intensiva de dados serão naturalmente atraídos para regiões com conetividade de alto nível. Com a abertura de novos corredores digitais, Portugal e, em particular, as suas regiões insulares podem aproveitar esta dinâmica para desenvolver ecossistemas tecnológicos, programas de formação e infra-estruturas inteligentes.

A era dos cabos submarinos não acabou; está a acelerar. E Portugal, mais uma vez, encontra-se no centro das rotas atlânticas, desta vez não para navios ou especiarias, mas para informação, inteligência e inovação.

A mensagem é clara: o futuro da resiliência digital da Europa e do fluxo transatlântico de dados pode não estar apenas nas suas capitais, mas nas nuvens e nos cabos ancorados no meio do oceano.